News
News AHK

“Empresas precisam de inovação para atingirem as metas climáticas”, defende Karin Breitman

12/04/2024

Especialista avalia que as ações atuais não são suficientes para as metas de sustentabilidade das companhias

Nos últimos anos, as empresas – especialmente as listadas em bolsas de valores – se comprometeram a reduzir as emissões de gases de efeito estufa geradas direta e indiretamente, e desenvolveram uma série de atividades para buscar as metas estabelecidas. “Ocorre que as metodologias e as respostas de hoje, definitivamente, não são o suficiente. Portanto, novas ideias terão de surgir. Ou, em outras palavras: vai ser preciso inovar!”. 

A afirmação é de Karin Breitman, membro independente do Conselho de Administração da ENGIE Brasil Energia. Ela também atua em outros conselhos de administração, é filiada a entidades de classes e participa da condução de programas sociais. 

Autora de livros,  artigos científicos e patentes, ela empunha a causa da diversidade de gênero no mercado de trabalho, e entende que isto está diretamente ligado à inovação. “É de entendimento comum que a diversidade e a inclusão melhoram os resultados das empresas. Por esse e outros motivos, há um esforço grande para aumentar a diversidade nos cargos mais elevados das companhias, inclusive nos conselhos de administração”, diz.

Nesta entrevista, ela explica sobre a relação da inovação com a inclusão feminina, além de revelar as suas impressões sobre as tecnologias que fazem a diferença no desenvolvimento corporativo. Acompanhe.

Quais são as suas ocupações atuais e como a sua carreira te direcionou até este momento?

Eu tive uma carreira bastante diferente. Fui professora e coordenadora da Engenharia da Computação na PUC do Rio de Janeiro até por volta dos 40 anos de idade. Depois eu mudei para o mundo empresarial, com várias ocupações. Porém, a gente tira a pessoa da universidade, mas não tira a universidade dela (risos). É por isso que, nas corporações, continuo atuando com o desenvolvimento de pessoas, software, e transferência de inovações para a indústria.

Que tipos de inovações?

A nossa tarefa é entender como transformar invenções como o big data, inteligência artificial generativa, realidade aumentada e outras em algo de valor para as empresas, de maneira que elas passem a ser mais eficientes para todos os seus stakeholders. Hoje, atuo em alguns conselhos de empresas, como a ENGIE, visando transmitir essa premissa.

Voltando para a sua carreira: o que mais você faz hoje, além de ser conselheira em empresas?

Faço muita coisa. Um dos projetos mais gratificantes que atuo hoje em dia é o SUPER. Ele foi desenvolvido e é operado pela Universidade Federal do Amazonas e pela Samsung, e se dedica a reduzir a evasão nas universidades. Isto é muito importante, porque boa parte do déficit de profissionais no mercado de trabalho de tecnologia se deve aos alunos que começam e não terminam a universidade. Para reduzir a evasão, nós trabalhamos com o aluno e com o professor, visando não só reter o estudante, mas também formá-lo melhor. Fazemos isso inovando sobre os ensinos tradicionais, mas também atuamos sob os aspectos psicológicos, que é um dos grandes motivos da evasão. Afinal, estamos falando de pessoas que são, muitas vezes, a primeira geração universitária em sua família. É preciso pensar em como criar esse tecido social para que o aluno tenha a formação necessária para o mercado e, ao mesmo tempo, suporte toda a carga psicológica envolvida.

Você continua atuando como autora de livros e patentes?

Sim. Acabo de criar um livro para crianças, com o intuito de desmistificar a ciência, a matemática, a tecnologia, as estatísticas e outras atividades técnicas. É uma ação para fazer com que esta geração se encante pela ciência. Queremos desmistificar o estereótipo do profissional de ciências e tecnologia. Trago exemplos como o da Hedy Lamarr, que foi uma atriz super badalada de Hollywood, de beleza admirada ao ponto de representar a Branca de Neve. Mas ela também era inventora e tem a patente do primeiro hotspot sem fio, que é a base para o espectro de propagação de salto de frequência (FHSS) que culminou na internet sem fio e no bluetooth, por exemplo. 

Isto também está ligado à inserção feminina nos mercados técnicos?

Sim. A falta de modelos de mulheres bem-sucedidas que inspiram outras a segui-las é algo muito sério. Há 18 anos eu fundei – junto com a professora Claudia Bauzer Medeiros da Unicamp, com quem atuava na Sociedade Brasileira de Computação – o Women in Information Technology, com a ideia de promover mais mulheres na tecnologia. É importante lembrar que até a década de 1980, o mercado de tecnologia era igualitário entre homens e mulheres, mas a participação feminina foi se reduzindo depois, conforme o poder econômico do setor aumentou. Quando saí da PUC/Rio (em 2012), a proporção de meninas formadas em disciplinas de engenharia estava na faixa de 20%. O mesmo acontece no mundo todo. 

Como vocês agiram nesse sentido?

A engenharia é uma área maravilhosa, então, por que não temos mais meninas interessadas por ela? Começamos a discutir isso nessa época, e trouxemos pessoas da indústria para falar de questões como a síndrome da impostora, que muda a forma como as mulheres se colocam nos processos de seleção. Resumidamente, essa síndrome está ligada ao fato de que as mulheres só se candidatam quando preenchem 100% dos requisitos para as vagas. Já os homens agem diferente, se arriscam mais.

O Women in Information Technology começou como um evento pequeno, mas hoje é bem grande, com um noticiário periódico sobre o tema, áreas de pesquisas, grupos de trabalho dedicados etc. Ao todo, há mais de 80 projetos parceiros no Brasil.

Você falou da necessidade de atrair o interesse de meninas para os setores da engenharia. Pode comentar mais a respeito?

Entre dez e 13 anos, o interesse das meninas pelas carreiras técnicas some. Então, precisamos trabalhar nessa faixa etária para construir a base da pirâmide. Toda empresa que se preze busca a equidade de gênero no seu quadro colaborativo hoje em dia. Porém, como eu adiantei, como é possível alcançar isso se apenas 20% das pessoas formadas pelas universidades são mulheres? A conta não fecha. A ENGIE apoia um programa muito legal nesse sentido, o Menina de 10 anos, que busca despertar o interesse das meninas por setores tecnológicos nessa faixa etária.  

Além de trabalhar na base da pirâmide, é possível melhorar o equilíbrio de gênero no topo dela?

É de entendimento comum que a diversidade e a inclusão melhoram os resultados das empresas. Por esse e outros motivos, há um esforço grande para aumentar a diversidade nos cargos mais elevados das empresas, inclusive nos conselhos de administração. Algumas bolsas de valores, inclusive a B3, passaram a associar a diversidade às metas financeiras das companhias. Como engenheira elétrica, defendo que o importante não é olhar o número, mas a tendência e, por tudo que coloquei, a tendência é de mais inclusão, apesar de ainda estarmos longe do necessário.

Que ações práticas para inclusão feminina em conselhos você destacaria?

É muito difícil ser a única na sala. É importante ter identificação, ou seja: ter mais mulheres no mesmo conselho administrativo, como é o caso da ENGIE. Algumas empresas já atuam nesse sentido, convidando mais de uma conselheira para o board. Entendo que esse movimento precisa continuar e ser ampliado.

Você relaciona aspectos de sustentabilidade – como a diversidade e inclusão – com a inovação?

As empresas da S&P 500 se comprometeram com objetivos ambientais agressivos, inclusive no escopo 3 do GHG Protocol, que diz respeito às emissões de terceiros. E listaram uma série de atividades nesse sentido. Ocorre que elas estão chegando à conclusão de que mesmo com todas essas ações, não terão resultados suficientes para atingir as metas. As metodologias e as respostas de hoje, definitivamente, não são o suficiente! Então, novas ideias terão de surgir. Ou, em outras palavras: vai ter de ter inovação!

Pode exemplificar?

Falando especificamente da minha área, a inteligência artificial é bastante promissora, pois uma das formas de reduzir emissões é gastar menos recursos, ser mais eficiente. A IA é uma grande ferramenta para isso, à medida que pode otimizar processos. E isto também vale para a cadeia de suprimentos. Na verdade, o grande truque é entender como diminuir a perda nas interfaces. Se falarmos das emissões de um navio, por exemplo, precisamos mapear o que é feito antes, nas linhas férreas que vão transportar o produto até a embarcação, por exemplo. Precisamos entender como fazer com que todo esse trajeto seja mais eficiente, e é aí que entra a inovação.

Que inovações digitais você destaca?

Vejo a internet das coisas como a mais importante, na medida em que o sensoriamento aumenta a precisão do que se está utilizando. Tem um ditado de gestão que diz que só se consegue controlar o que se mede. Nos últimos anos, por conta da Conferência do Clima (COP), a população adquiriu noção maior do seu impacto sobre a natureza e, portanto, de como reduzi-lo. A ENGIE tem ações importantes nesse sentido, caso da descarbonização do Rio Open, que, além dos efeitos práticos de redução de emissões, desempenhou um papel educativo.

Em outra instância, quando vou a um restaurante, não aceito mais uma água importada. Entendi que não faz sentido estimular o comércio de uma água que passa por todo esse transporte. Já os meus filhos nem sequer bebem água engarrafada, pois entendem que não faz sentido usar esse recurso (garrafa PET) adicional. Enfim, isso tudo demonstra que há uma demanda da sociedade pelas ações de descarbonização, e as empresas, com apoio de tecnologias, devem atender a isso.

Fonte: Além da Energia